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Nota Técnica CIJERR 01/2023

 

Ementa: Adesão à Nota Técnica CIJMG n.º 03/2022, sobre inobservância de precedente qualificado e má-fé processual.

 

1. Introdução

 

O Centro de Inteligência da Justiça Estadual de Roraima (CIJERR) foi preconizado pela Resolução CNJ n.º 349/2020 e instituído pela Portaria TJRR/PR n.º 548/2020. Atualmente, sua composição é a prevista na Portaria TJRR/PR n.º 506/2023.

Seu objetivo precípuo é “identificar e propor tratamento adequado de demandas estratégicas ou repetitivas e de massa”. Porém, ainda figuram dentre suas atribuições:

a) emitir notas técnicas referentes às demandas repetitivas ou de massa, notadamente para recomendar a uniformização de procedimentos administrativos e jurisdicionais e o aperfeiçoamento da legislação sobre a controvérsia; e

b) sugerir medidas para o aperfeiçoamento procedimental das rotinas das secretarias judiciais no processamento de feitos que tenham recebido a mesma solução.

Ademais, ao disciplinar o Prêmio de Qualidade, o Conselho Nacional de Justiça permitiu que, de cada 3 Notas Técnicas emitidas, "duas deverão ser próprias do centro de inteligência do Tribunal e uma pode ser de adesão" (Portaria CNJ n.º 82/2023). Assim, foi proposta a presente Nota Técnica de adesão.

 

2. Justificativa

 

Tendo em vista a necessidade de garantir a segurança jurídica e a isonomia, faz-se necessária a fixação da estratégia mais adequada para padronização dos critérios a serem adotados por todas as unidades judiciais deste Tribunal a respeito do seguinte assunto: inobservância de precedente qualificado e má-fé processual.

Ao tratar do assunto na Nota Técnica n.º 03/2022, o Centro de Inteligência da Justiça de Minas Gerais (CIJMG) recomendou:

a aplicação da multa por litigância de má-fé nos casos em que a parte demandar, em postulação ou defesa, contra precedente vinculante firmado por este Tribunal ou pelos Tribunais Superiores, sem que haja sustentação de distinção, de superação (quando cabível) ou de fundamento essencial verdadeiramente novo.

Ao reconhecer a relevância do tema e sua aplicabilidade ao judiciário roraimense, é de se propor a adesão à referida Nota Técnica, o que se justifica pela necessidade de uniformizar o entendimento do Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR) a respeito da forma de tratamento das demandas que formulem pedido expressamente contrário a precedente vinculante.

Diante da disposição expressa do art. 927 do CPC, os precedentes obrigatórios assumiram o caráter de fonte primária do direito, devendo ser observados cogentemente pelos juízes e tribunais. Tal dispositivo, indiretamente, acaba por equiparar aquelas disposições judiciais às normas legisladas, com a mesma força vinculante e, consequentemente, a mesma eficácia, inclusive em relação aos efeitos em caso de descumprimento.

A este respeito, a NT CIJMG 03/2022 ressalta a força vinculante dos precedentes qualificados nos planos vertical e horizontal, evidenciada em diversos dispositivos do CPC, demonstrando a ênfase dada pelo legislador na busca pela integridade, coerência e estabilização da jurisprudência pátria, bem como por uma prestação jurisdicional mais célere e uniforme.

Assim, ao demandar em juízo, a parte deve observar eventual entendimento consolidado em precedente obrigatório. Caso pretenda a aplicação de entendimento contrário, deve demonstrar a existência de distinção ou a necessidade de superação da tese firmada ou, ainda, apresentar argumento novo, não analisado na formação do precedente, que seja capaz de reverter o entendimento consolidado. Portanto, cabe à parte o ônus de verificar se há precedente vinculante aplicável ao caso antes de postular em juízo. Assim como não é possível se escusar do cumprimento da lei alegando seu desconhecimento (art. 3.º da LINDB), não se admite postulação contrária a precedente invocando falta de conhecimento.

O art. 80, I, do CPC preceitua que deve ser considerado “litigante de má-fé aquele que deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso.” Constata-se daí a necessidade de extensão interpretativa aos precedentes obrigatórios. Logo, deve-se "considerar litigante de má-fé aquele que deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de precedente obrigatório". Espera-se que esse entendimento desestimule as condutas descritas, reforçando a autoridade dos precedentes vinculantes e garantindo a integridade e unicidade da jurisprudência deste Tribunal e dos Superiores.

Vale trazer à baila que a não observância de precedente qualificado culminou na afetação do Tema 1201 do STJ no dia 20/06/2023, cuja questão submetida versa sobre:

1) Aplicabilidade da multa prevista no § 4º do art. 1.021 do CPC quando o acórdão recorrido baseia-se em precedente qualificado (art. 927, III, do CPC);

2) Possibilidade de se considerar manifestamente inadmissível ou improcedente (ainda que em votação unânime) agravo interno cujas razões apontam a indevida ou incorreta aplicação de tese firmada em sede de precedente qualificado.

Importante ressaltar que não se trata de criação de nova hipótese de litigância de má-fé, mas de configuração da hipótese de incidência prevista na legislação processual civil. Ora, o precedente vinculante nada mais é do que o resultado da atividade de interpretação, pelos tribunais, do ordenamento jurídico vigente, particularmente da Constituição e das leis, observados certos procedimentos e requisitos legais, dos quais decorre a vinculatividade reconhecida pelo CPC.

Outrossim, não se trata de impedir as partes de participar da construção da decisão do caso concreto, nem de contribuir para a evolução do Direito jurisprudencial, mas de resguardar a força obrigatória dos precedentes vinculantes, dos deveres de cooperação e lealdade e a regularidade do acesso ao sistema de justiça.

 

3. Recomendação

 

O CIJERR, para a uniformização de procedimentos administrativos e jurisdicionais e o aperfeiçoamento da legislação sobre a controvérsia, resolve aderir à NT CIJMG 03/2022 para recomendar a todos os magistrados do Tribunal de Justiça de Roraima, respeitadas a independência funcional e a liberdade de convicção na prolação de suas próprias decisões, que avaliem a pertinência e a juridicidade do entendimento constante deste documento.

Diante de todo o exposto, este CIJERR entende que, diante da disposição expressa do art. 927 do CPC, os precedentes obrigatórios se equiparam “a texto expresso de lei ou fato incontroverso” como referido no art. 80, I, do CPC. Assim, deduzir em juízo pretensão ou defesa contra texto expresso de precedente vinculante firmado por este Tribunal ou pelos Superiores pode configurar litigância de má-fé, caso a parte não sustente, fundamentadamente, distinção, superação ou fundamento novo, não discutido na formação do precedente e que seja, por si só, capaz de infirmar a tese. Diante de tal constatação, deve ser aplicada a multa prevista no art. 80 do CPC.

 

4. Dispositivo

 

O CIJERR, reunido em 27/07/2023, decidiu, por unanimidade, aprovar a presente Nota Técnica aderindo à NT CIJMG 03/2022, para firmar o seguinte entendimento:

 

“Configura litigância de má-fé, com a aplicação da correspondente multa, deduzir em juízo pretensão ou defesa contra texto expresso de precedente vinculante, desde que a parte não sustente, fundamentadamente, distinção, superação ou fundamento novo, não discutido na formação do precedente e que seja, por si só, capaz de infirmar a tese.”

 

Publique-se no Diário de Justiça Eletrônico do TJRR e na página do CIJERR.

Providencie-se ampla divulgação ao público interno do TJRR e à sociedade em geral, especialmente ao Ministério Público Estadual, Defensoria Pública Estadual, OAB e às Procuradorias Estaduais e Municipais.

 

Boa Vista, Roraima, 27 de julho de 2023.


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Documento assinado eletronicamente por RICARDO DE AGUIAR OLIVEIRA, Vice-Presidente, em 27/07/2023, às 17:36, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. Portaria da Presidência - TJRR nº1650/2016.


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